Créditos: Imprensa SINSSP

A cidadania, que abrange direitos e deveres iguais para toda a população, sem quaisquer discriminações, somente prevalece com o respeito à dignidade do ser humano. O serviço público deve ir ao encontro desses princípios e ser seu garantidor, conforme previsto no Artigo 6º da Constituição Federal de 88. Aliás, o primeiro dispositivo da Carta assegura o bem-estar social e as prerrogativas individuais e coletivas.

Assim, é obrigação do Estado a prestação de bons serviços aos cidadãos, que somente é possível por meio da administração e dos servidores públicos, que são fundamentais. Por isso, não devem ser terceirizados serviços essenciais, que não têm nenhuma finalidade lucrativa. Ao contrário, os investimentos nessas áreas prioritárias deveriam ser direcionados ao setor público, para agregar qualidade. Daí, a importância de servidores públicos capacitados e, portanto, dos concursos, que são decisivos para a seleção profissional de excelência.

Um exemplo emblemático da importância e competência do setor público observou-se no atendimento à população na pandemia. Foi excepcional e heroico o trabalho de médicos, enfermeiros, professores, bombeiros, policiais e outros servidores.

Considerando todas essas razões, é preocupante a postura dos governos no País, com raras exceções, de desprestigiar o serviço público e tentar reduzir sua relevância. Tal atitude, que tem exigido grande esforço das entidades de classe representativas do funcionalismo, prejudica de modo direto a sociedade, pois atinge de modo contundente a cidadania.

Quando não há condições adequadas de trabalho, estrutura física e tecnológica e valorização dos profissionais, precarizam-se os serviços prestados à população. Isso fere os direitos do cidadão à educação e saúde de qualidade, segurança pública e atendimento ágil e de excelência em todas as instâncias.

Infelizmente, nota-se uma desfiguração do serviço público e da cidadania, numa perversa relação de causa-efeito. São vários exemplos lamentáveis desse processo, como o de um ministro indignado pela possibilidade de uma trabalhadora doméstica ir à Disney. Observa-se até mesmo um ranço com relação ao progresso individual das pessoas.

Cabe considerar que a qualidade do serviço público depende das características de impessoalidade, legalidade, moralidade e eficiência, que resguardam a administração, como consta do Artigo 37 da Constituição. Como prefeitos, governadores, presidente da República, vereadores, deputados estaduais e federais e senadores são eleitos pela população, para, em nome dela, exercitar o poder, é importante que as eleições qualifiquem cada vez mais os ocupantes dos cargos eletivos, para que prevaleçam os direitos inerentes à cidadania.

Porém, temos assistido à qualidade da administração e da sua estrutura ser deteriorada pela política, ao contrário do que deveria ocorrer. Muitos governantes estão adotando uma política reducionista de seu significado. Por isso, a reforma administrativa em tramitação no Congresso Nacional deveria ser no sentido de melhorar o serviço público e não de enfraquecê-lo. Da maneira como está, a proposta agride os direitos sociais do funcionalismo e atinge a própria cidadania.

A rigor, o desprestígio do serviço público e suas consequências negativas para o exercício pleno da cidadania conspiram contra o Estado de Direito. Por isso, precisamos fazer grande empenho para a prevalência das disposições constitucionais. É na observância da Lei Maior que se fundamenta a tão aludida segurança jurídica!

Fonte: *Artur Marques da Silva Filho é desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e presidente da Associação dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo (AFPESP).