Inflação dos alimentos: Sem estoque regulador, preços ainda vão demorar a cair

A inflação dos alimentos continua sua escalada de alta e, mesmo com a deflação causada pela queda nos preços dos combustíveis, os trabalhadores e trabalhadoras continuam levando para os caixas dos supermercados carrinhos quase vazios.

O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do Brasil, registrou queda de 0,36% pelo segundo mês seguido em agosto, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em julho, o índice havia recuado 0,68%.

Mas, os trabalhadores que não gastam com gasolina, usam seus parcos salários para comprar comida para família, não sentiram os efeitos da deflação e a única opção é cortar produtos que gostariam, mas não podem levar.

A alta de produtos básicos entre 2019 e 2022, como o óleo, que subiu 180%, o café (+110%) e o leite longa vida (+105%) pesam muito no bolso de todos os brasileiros, em especial dos mais pobres, conforme dados da pesquisa de preços da cesta básica, realizada pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômico (Dieese), que podem ser conferidos na tabela abaixo.

Com salários arrochados, sem reajuste de acordo com o índice de inflação ou que apenas repõem o percentual acumulado em 12 meses, sem contar os que nem salário fixo têm porque vivem de bico, um contingente de quase 40 milhões de pessoas, milhões de brasileiros sofrem com os efeitos da inflação dos alimentos. E pelos índices de alta acumulada que as tabela do Dieese mostra, os preços têm de cair muito para o povo voltar a encher o carrinho do supermercado de comida.

E por que os preços dos alimentos subiram tanto?

"Os preços dos alimentos subiram muito no último período por um conjunto de fatores externos, como pandemia, guerra, alta das commodities no plano internacional", responde a técnica do Dieese, Adriana Marcolino, que complementa: "Mas o governo federal se limitou a assistir".

"Um país do tamanho do Brasil pode fazer muita coisa internamente para reduzir esses impactos", diz Adriana.

"Fatores internos também influenciam na alta dos preços dos alimentos", prossegue a técnica do Dieese. "Faltaram ações por parte do governo federal que resultassem no aumento da produção de alimentos pela agricultura familiar com políticas adequadas, em estoques reguladores de preços, no acesso de alimentos à população de baixa renda, no acesso à terra através dos programas de reforma agrária", diz ela.

"Em agosto, alguns poucos produtos alimentícios tiveram uma redução nos preços, mas isso não é suficiente diante do aumento expressivo que tiveram no último período. E isso fica muito evidente quando vamos no supermercado", acrescenta Adriana Marcolino.

Além disso, ressalta, "o controle da inflação pressupõe um governo com capacidade de gestão e atento a questões econômicas macro e micro, o que não é o caso do atual mandatário do Brasil e sua equipe econômica, que não tem projeto em nenhum setor e ainda destrói políticas construídas no passado".

A inflação de alimentos é uma das consequências da falta de controle dos estoques do governo, que acabou com as políticas públicas como os estoques regulares que colaboram para estabilizar os preços, através da Companhia Nacional de Abastecimento, a Conab, explica a técnica do Dieese.

Desde o golpe de 2016, que destituiu a presidenta Dilma Rousseff (PT), os estoques de alimentos da Conab, ligada ao Ministério da Agricultura, vêm caindo, até chegar a um nível próximo de zero. Embora difícil de mensurar, isso causa impacto nos preços, por reduzir a oferta. Em momento de alta da inflação e nos preços dos alimentos, o país abriu mão de um instrumento que poderia ajudar a reduzir essa pressão.

Em maio do ano passado, já haviam sido fechado 27 armazéns da Conab, segundo o Boletim Especial de 1º de Maio do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

E isso é trágico porque, além de ser responsável pelos estoques, a Conab é a principal compradora de produtos da agricultura familiar, setor essencial para alimentação dos brasileiros - produz cerca de 70% dos alimentos consumidos no país - que também sofreu com o desgoverno.

“A Conab existia para um momento de crise, para ajudar a evitar a carestia dos alimentos, mas os estoques reguladores foram diminuindo tanto que agora não conseguem ajudar a população a pagar mais barato pela alimentação”, disse em entrevista ao Portal CUT Gustavo Monteiro, economista e um dos técnicos do Dieese que elaborou o boletim especial de 1º de Maio de 2021.

 


Campanha contra a carestia: preço da cesta básica sobe em todo o país e custa quase 60% de um salário mínimo

Em alta constante, o custo médio da cesta básica, em novembro, aumentou em nove de 17 capitais pesquisadas pelo Dieese. No ano, o aumento foi generalizado, chegando a até 18%, bem acima da inflação oficial, na casa dos 10%. De acordo com o instituto, o trabalhador que ganha salário mínimo compromete quase 60% de sua renda líquida para comprar uma cesta.

As maiores altas no mês passado foram apuradas em capitais do Norte-Nordeste, com destaque para Recife (8,13%), Salvador (3,76%) e João Pessoa (3,62%), além de Natal, Fortaleza, Belém e Aracaju. Também houve aumento em Florianópolis e Goiânia. Entre as quedas, as principais ocorreram em Brasília (-1,88%), Campo Grande (-1,26%) e Rio de Janeiro (-1,22%).

Mínimo x cesta

De janeiro a novembro, todas as capitais pesquisadas têm alta, variando de 4,44% (Aracaju) a 18,25% (Curitiba). Em São Paulo, o aumento foi de 9,63%. Já no acumulado em 12 meses os preços também têm elevação em todas as cidades: de 3,65% (Salvador) a 16,75% (novamente Curitiba).

A cesta de menor valor foi a de Aracaju (R$ 473,26). E a mais cara, a de Florianópolis (R$ 710,53). Com base nessa, o Dieese estimou em R$ 5.969,17 o salário mínimo necessário para as despesas básicas de um trabalhador e sua família em novembro. Esse valor corresponde a 5,42 vezes o piso nacional (R$ 1.100). A proporção era de 5,35 no mês anterior.

Renda mais curta

Segundo o Dieese, o tempo médio necessário para adquirir os produtos da cesta básica subiu mais de uma hora em relação ao mês anterior, para 119 horas e 58 minutos. E o trabalhador que ganha mínimo comprometeu 58,95% da renda líquida (descontada a Previdência) com os itens básicos. Mais uma vez, houve aumento em comparação com outubro (58,35%).

O preço do quilo do café em pó subiu em todas as capitais, chegando a 23,63% em Recife, a 11,94% em Florianópolis e a 11,39% no Rio. O preço do açúcar aumentou em 16 cidades, com estabilidade em Belo Horizonte. Já os preços do feijão e do arroz agulhinha diminuíram em novembro.