Primeira lei da Previdência, de 1923, permitia aposentadoria aos 50 anos

Se o governo propusesse uma reforma da Previdência em meados da década de 1920, não haveria mobilizações, embates, impasses, polêmica. Pelo menos não na intensidade que se veem hoje. As mudanças só preocupariam os funcionários das estradas de ferro e os servidores de uma ou outra repartição pública. Esses eram os únicos que tinham a aposentadoria garantida por lei.

Data de 1923 a lei federal que fez dos ferroviários, no setor privado, os precursores do direito a um pagamento mensal durante a velhice. Conhecida como Lei Eloy Chaves, a norma é considerada a origem da Previdência Social. Foi sobre esse alicerce que o sistema previdenciário cresceu até chegar ao modelo atual, que paga aposentadorias, pensões e outros benefícios a 35 milhões de brasileiros nos setores público e privado.

A Lei Eloy Chaves obrigou cada companhia ferroviária do país a criar uma caixa de aposentadorias e pensões (CAP), departamento incumbido de recolher a contribuição do patrão e a dos funcionários e pagar o benefício aos aposentados e pensionistas. No decorrer de 1923, 27 empresas instituíram suas respectivas CAPs.

Para fazer jus à aposentadoria, o empregado precisava ter no mínimo 50 anos de idade e 30 anos de serviço no setor ferroviário. O valor do pagamento era ligeiramente inferior à média dos últimos salários recebidos na ativa.

O Senado e a Câmara dos Deputados tiveram papel decisivo na concepção dos rudimentos da Previdência Social. A lei que o presidente Arthur Bernardes assinou em janeiro de 1923 foi proposta pelo deputado federal Eloy Chaves (SP) e aprovada pelas duas Casas do Congresso Nacional.

A novidade, porém, não foi bem recebida pelos empresários. Segundo documentos históricos guardados nos Arquivos do Senado e da Câmara, parlamentares denunciaram que vários patrões tentavam burlar a lei para não pagar as aposentadorias na forma prevista.

Indignado, o senador Irineu Machado (DF), que havia trabalhado na Estrada de Ferro Central do Brasil antes de entrar na política, subiu à tribuna do Senado, no Rio de Janeiro (que tinha o status de Distrito Federal):

— É natural que os funcionários ferroviários de idade mais avançada, nesse período da vida em que o homem começa a curvar-se para a terra em busca do túmulo, pensem em obter as vantagens da aposentadoria. De fato, os velhos servidores foram os que levantaram a ideia e recorreram ao coração generoso de Eloy Chaves, a quem coube a glória imorredoura dessa iniciativa. No entanto, quando entra em vigor a lei, surgem surpresas. Todas as empresas vão buscando interpretações capciosas e contrárias ao direito dos homens do trabalho.

Machado desfiou uma lista de irregularidades. Algumas ferrovias não depositavam a sua contribuição nas CAPs. Outras até a depositavam, mas gastavam “a mãos largas” o dinheiro arrecadado “sem dar satisfações a ninguém”. Certas empresas impediam representantes dos empregados de fazer parte do conselho de administração das CAPs, nelas empossando apenas seus próprios executivos.

A São Paulo Railway Company avisou que, pelo menos no primeiro momento, só aposentaria os funcionários que completassem 60 anos, 10 a mais do que a idade mínima prevista na lei. O argumento é que a CAP ainda não havia acumulado dinheiro suficiente para pagar o grande número de funcionários que já haviam chegado aos 50.

Numa interpretação tendenciosa da Lei Eloy Chaves, a Leopoldina Railway Company decidiu que a contagem dos 30 anos de serviços prestados — outro requisito para a concessão da aposentadoria — começaria apenas no dia em que a norma entrou em vigor.

— Imaginemos o caso do empregado que atualmente conta 50 anos de idade e 30 de serviço — continuou o senador. — Se a lei fosse conforme a interpretação dada pela administração da Leopoldina, teríamos como consequência que só aos 80 anos de idade esse empregado teria direito à aposentadoria. Tal entendimento é uma violência feita aos direitos do pessoal daquela casa. Ora, os homens avançados em idade, aqueles que a empresa já explorou por maior espaço de tempo e inutilizou em seu serviço, teriam que morrer sem a fruição da aposentadoria. A Leopoldina não pode ir tão longe na sua exploração, elevando tanto os lucros e esquecendo os mais santos direitos da classe trabalhadora.

Para que a lei saísse integralmente do papel, foi preciso que o presidente Arthur Bernardes pressionasse as empresas. As companhias, muitas das quais estrangeiras, tiveram que ceder porque o serviço ferroviário era uma concessão pública e elas não queriam perder o contrato. Na Câmara, o deputado Eloy Chaves discursou:

— Este é o momento para dizer que o eminente chefe de Estado resistiu a todos os trabalhos subterrâneos para que essa lei fosse desnaturada e, nobremente, declarou que a lei votada deveria ser cumprida em toda a sua integridade.

A lei não veio por benevolência. Foi em resposta às greves nas estradas de ferro que o poder público instituiu o direito à aposentadoria. Esperava-se, assim, aplacar a insatisfação dos ferroviários. Na Câmara, o parecer da Comissão de Legislação Social a respeito do projeto de Chaves trouxe o seguinte argumento:

“Se a criação das caixas [de aposentadorias dos ferroviários] determinar, como tudo leva a crer, um melhor entendimento entre empresários e trabalhadores, as consequências dessa harmonia serão a maior eficiência e regularidade do serviço ferroviário e a abolição das greves”.

Se agora quem consegue paralisar o Brasil são os caminhoneiros, na Primeira República esse poder era dos ferroviários. O país dependia das estradas de ferro. Em 1923, as pessoas e as mercadorias (incluindo o café, base da economia nacional) viajavam em trem e navio. Não havia ônibus nem caminhão, e carro era para poucos. As raras estradas eram de terra.

Os ferroviários não hesitavam em exercitar o poder de paralisar o Brasil. De 1906 em diante, praticamente não passou ano sem que se registrasse paralisação em estradas de ferro. Os ferroviários engrossaram inclusive a histórica greve geral de 1917, em São Paulo.

A lista de reivindicações dos grevistas incluía direitos trabalhistas que hoje são básicos, mas na época inexistiam, como reajuste salarial periódico, adicional noturno, auxílio médico, férias, aposentadoria. Tais demandas não eram só do setor ferroviário. O Brasil havia abolido a escravidão pouco tempo antes, em 1888, e os empresários ainda não entendiam por que tinham que garantir o bem-estar de seus empregados. As “agitações operárias”, como se dizia, eram constantes.

Até a exploração das crianças estava liberada. Considerando a existência do trabalho infantil, a Lei Eloy Chaves permitia que o ferroviário se aposentasse antes dos 50 anos de idade caso tivesse cumprido o mínimo de 30 anos de serviço. O valor do benefício, nessa situação, sofreria um corte de 25%. Quem tivesse entrado numa estrada de ferro aos 10 anos de idade, por exemplo, conseguiria se aposentar aos 40.

Quando apresentou o projeto, Chaves afirmou que objetivava acabar com a “áspera luta de classes”:

— Até agora, os funcionários das ferrovias do país não têm nenhuma garantia para seus dias de velhice e para arrimo de sua família em caso de morte. É verdade que em algumas companhias existem sociedades beneficentes com ação limitada a socorros médicos e medicamentos, mas isso não basta. Estamos em novos tempos. As classes menos favorecidas aspiram mui justamente a um maior quinhão de vida e de conforto. Cumpre atendê-las com espírito liberal e amigo.

Chaves conhecia bem as paralisações. No governo de São Paulo, como secretário estadual de Justiça e Segurança Pública, ele foi uma figura central na greve geral de 1917: no início, mandando a polícia atacar os manifestantes e, no fim, mediando as negociações entre os grevistas e os empresários.

O deputado também conhecia bem os ferroviários. Seu reduto político era Jundiaí (SP), onde ficava a sede da Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Os funcionários da empresa representavam boa parte de seu eleitorado.

Eloy Chaves ouviu críticas por favorecer uma única categoria profissional e esquecer-se de todas as demais. Ele se defendeu explicando que se tratava de uma estratégia para vencer a resistência dos empresários:

— Este é apenas o primeiro degrau de uma longa escada.

Mais degraus, de fato, viriam em seguida. Com o passar dos anos, as determinações da Lei Eloy Chaves foram evoluindo até que em 1988 a Constituição estabeleceu que a aposentadoria é um direito de todos os cidadãos.

 

 


Previdência Social: UMA CENTENÁRIA DE RESPEITO!

No Dia 24 de janeiro a aniversariante mais ilustre do Brasil completa 100 anos de existência, a Previdência Social brasileira completa um século beneficiando e assistindo milhões de brasileiros.

Nos últimos anos ela foi extremamente maltratada e vilipendiada por governantes não muito preocupados com a sua importância ou com o que ela representa para tantos brasileiros.

Nos governos Temer e Bolsonaro, a Previdência Social foi duramente golpeada com medidas impopulares e que visavam sucateá-la para justificar à população uma possível privatização.

Os ataques foram muitos, pararam os concursos, teve perda de mais de 11 mil servidores ativos, houve sucateamento das agências, do parque tecnológico, sem falar na reforma da previdência (EC-103) que se iniciou no governo Temer, mas por sua impopularidade foi adiada por conta das eleições de 2018.

Porém a EC-103 foi retomada no primeiro ano do governo Bolsonaro, foi a reforma mais dura e mais cruel que reduziu inúmeros direitos dos brasileiros, espantou o contribuinte e após muitas idas e vindas no Congresso foi aprovada e promulgada pelo ex-presidente em 12/11/2019.

Mas apesar de todos esses contratempos e da vontade de Paulo Guedes em privatizar a Previdência Social, ela resistiu bravamente e continua viva, atendendo quase 40 milhões de brasileiros e é quase inimaginável que haja alguma família que não tenha ninguém que use ou que já tenha usado a Previdência Social, seja atrás de uma aposentadoria, de uma pensão, de algum auxílio, ou mesmo de um benefício assistencial.

O INSS, autarquia que representa a Previdência Social perante os brasileiros, é o maior distribuidor de renda de toda a América Latina, muitos municípios brasileiros recebem mais dinheiro proveniente de pensões e aposentadorias dela do que do Fundo de Participação dos Municípios, essa informação demonstra que a Previdência Social/INSS tem uma relevância econômica e social muito maior do que pensam economistas e jornalistas de plantão.

A Previdência Social remonta os tempos do segundo império, mas oficialmente seu início começa com a promulgação da Lei Elói Chaves em 24/01/1923 que consolidou a base do sistema previdenciário brasileiro com a criação da Caixa de Aposentadorias e Pensões para os empregados das empresas ferroviárias.

Após a promulgação desta lei, outras categorias foram beneficiadas e seus empregados também passaram a ser segurados da Previdência Social. Assim, ao longo da década de 30, no governo de Getúlio Vargas, surgem os antigos IAP’s que reunia os trabalhadores por categoria (comerciários, industriários, bancários, etc,), já na década de 60, os IAP’s apresentavam problemas financeiros, gerados em sua maioria por legislações muito benevolentes e gastos exagerados em sedes suntuosas e a comercialização de imóveis residenciais para seus associados.

Em 1966 todos os IAP’s foram fundidos no INPS, para que o governo pudesse sanear as contas e continuar a pagar os milhares de beneficiários que dependiam de suas aposentadorias e pensões.

A situação seguiu igual até 1977, quando o INPS se transformou no SINPAS, reunindo alguns institutos que se dividiam por atividade prestada à população, o INAMPS prestava os atendimentos médicos, o IAPAS os serviços ao contribuinte, a LBA respondia pela assistência social, o INPS ficou apenas com a administração e concessão dos benefícios previdenciários, a DATAPREV cuidava do armazenamento de dados, além da FUNABEM e do CEME.

Em 1988 tivemos a promulgação da nova Constituição Federal, sendo esta a responsável por consolidar a Previdência Social como um sistema de direitos, de cidadania e com base na solidariedade e exigindo como contrapartida um esforço de cada um dos membros da sociedade em seu financiamento.

Um dos princípios básicos da Carta Magna de 1988 é o de que a previdência seja solidária, devendo assegurar o sustento do trabalhador e de sua família quando este não puder se manter, seja por doença, gravidez, prisão, acidente, morte ou velhice. Outra inovação importante foi a de tornar a Previdência Social um direito no âmbito da seguridade social junto com a saúde e a assistência social.

Essa universalidade da cobertura previdenciária permitiu trazer para o sistema milhões de trabalhadores rurais, que antes tinham apenas a cobertura do FUNRURAL, que seguia um modelo assistencialista. Houve também um salto qualitativo na previdência rural, pois, até aquela época, as aposentadorias eram restritas aos chefes de família, em geral homens, e o valor que passou de meio salário-mínimo para 1 salário-mínimo. Para as mulheres a situação era ainda pior, tinham direitos restritos, apenas se fossem o arrimo da família, ou então o direito de receber uma pensão, com valor limitado a um terço do salário-mínimo.

Vale salientar ainda que com a promulgação da Constituição Federal de 1988, várias atividades mudaram de responsabilidade, assim o SINPAS foi extinto e várias autarquias foram deslocadas para outros ministérios como o INAMPS, por exemplo, que foi parar no Ministério da Saúde. O INPS e o IAPAS foram fundidos no atual INSS ficando junto com a DATAPREV sob a égide do Ministério da Previdência Social, que foi lamentavelmente extinto por Bolsonaro e agora foi recriado para poder oferecer uma gestão melhor da Previdência Social para os brasileiros.

Hoje, cabe a nós fiscalizar e acompanhar todas alterações e modificações que são feitas na Previdência Social e no INSS. Pois ela é nossa, é do Brasil e de todos os brasileiros, não podemos deixar que aventureiros lancem mão sobre a nossa garantia de uma velhice tranquila e segura.

Para que todos os brasileiros possam se aposentar e/ou ter direito a outros benefícios previdenciários temos que cobrar de todos os políticos seriedade e responsabilidade ao gerir o INSS e a Previdência Social brasileira, para que ela se perpetue por muitos e muitos anos, que este seja apenas o primeiro centenário de muitos que virão pela frente e assim continuar assistindo a população como sempre o fez.

Neste 24 de janeiro também celebramos o Dia Nacional do Aposentado, por meio do Decreto de Lei nº 6.926/81. Todos os aposentados são espelhos para quem iniciou ou está iniciando a vida profissional, um caminho longo que transcreve momentos de cansaço, disposição, de muitas derrotas, mas também de vitorias, além de planejamento.

Que possamos eternizar as comemorações que unidas numa só data representam a dignificação dos brasileiros. Viva o centenário da Previdência Social e viva o Dia Nacional do Aposentado!

Clique aqui para ter acesso ao SINPAS. (Fonte:  Inf. Legisl. Brasília/1978)

Clique aqui para ter acesso ao Decreto 4682.(Fonte: Portal da Câmara dos Deputados)

 


Episódio #100 do MEGAFONE - O centenário da Previdência Social e o episódio de número 100 do MEGAFONE, uma coincidência que precisa ser celebrada

No episódio #100 do MEGAFONE, o canal de Podcast do SINSSP traz um programa de grandes celebrações. No mesmo período em que o SINSSP publica o programa de número 100, a Previdência Social celebra o seu centenário em conjunto com o Dia Nacional do Aposentado. Fiquem sintonizado com a gente!

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