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As políticas públicas em saúde direcionadas às mulheres foram novamente atacadas pelo governo Bolsonaro. Desta vez, a polêmica mais recente se deu pelo veto, no último dia 07 de outubro, a trechos da Lei nº 14.214/2021, que institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual e estabelece o fornecimento de absorventes higiênicos às jovens estudantes de baixa renda nas escolas públicas de ensino fundamental e ensino médio e às mulheres privadas de liberdade, em situação de rua ou de vulnerabilidade extrema, dentre outras. De autoria da deputada Marília Arraes (PT/PE), a proposta foi apresentada em co-autoria com vários deputados da Casa e foi aprovada no Congresso em setembro. Mais uma vez Bolsonaro demonstrou perversidade, desrespeito à dignidade humana e profundo caráter misógino, marcas que definem suas ações.

A CNTSS/CUT – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social repudia a medida e apresentou-se contrária ao veto de Bolsonaro desde o primeiro momento e, desta forma, uniu esforços com outros setores sociais para derrubá-lo, assim como garantir ações imediatas de garantia de acesso a este item de higiene pessoal para as mulheres dos segmentos sociais mais vulneráveis economicamente. A ação mais recente refere-se à ratificação manifestada em favor da Recomendação do CNS – Conselho Nacional de Saúde, que será encaminhada aos senadores e deputados para rejeição ao veto. O documento reitera princípios estabelecidos na Constituição Federal referentes aos direitos à saúde “a partir do acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”, assim como a legislações que estabelecem os cuidados em saúde para crianças e adolescentes em processo de vulnerabilidade social, incluindo os serviços de saúde sexual e reprodutiva para as populações adolescente e adulta.

O texto destaca o estudo de 2021 da ONU/UNICEF sobre “Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos”. Entre os muitos dados, está o que aponta que “uma a cada quatro meninas que menstruam faltam às aulas por não ter acesso aos itens básicos de higiene no período menstrual, que dura de 5 a 7 dias normalmente”. Outros dois dados alarmantes consistem nas confirmações de que 51,5 milhões de mulheres estão abaixo da linha da pobreza e 13,6 milhões estão em condições de extrema pobreza. A Lei nº 14.214/2021 busca atender a uma demanda social em saúde pública que tem sido cada vez mais ampliada em virtude da forte crise econômica por qual o país atravessa, agravada ainda mais agora pela pandemia do Covid-19.

A falácia do governo, que justificou seu veto por não haver recursos para cumprir o que determina a Lei, é facilmente desmentida uma vez que no escopo da Lei estão asseguradas as fontes de recursos: o SUS – Sistema Único de Saúde e o FUNPEN – Fundo Penitenciário, consignados ao Ministério da Saúde, “observados os limites de movimentação, empenho e pagamento da programação orçamentária e financeira anual.” A proposta da deputada pernambucana apresentava que: “o Poder Público adotará as ações e as medidas necessárias para assegurar a oferta gratuita de absorventes higiênicos femininos às beneficiárias de que trata o art. 3º desta Lei e, no âmbito do Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, os absorventes higiênicos femininos feitos com materiais sustentáveis terão preferência de aquisição, em igualdade de condições, como critério de desempate, pelos órgãos e pelas entidades responsáveis pelo certame licitatório.”

A CNTSS/CUT reitera que o atendimento a esta demanda extrapola a questão de saúde pública e insere-se na perspectiva dos Direitos Humanos, como também preconiza a ONU – Organização das Nações Unidas. A autora da Lei tem a estimativa que será necessário o aporte anual de cerca de R$ 84 milhões para atender em torno de 6 milhões de mulheres/meninas. Como tem sido comum, o governo tentou manter seu posicionamento chantageando a sociedade com o falso dilema: “a prioridade é a vacina ou o absorvente, como quis estabelecer a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. Bolsonaro, em tom jocoso e desrespeitoso, refere-se à legislação como “Bolsa modes”, demonstrando a perversidade de seu posicionamento e sua insensibilidade já conhecida pelos brasileiros e mundo à fora.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM/MG) já se pronunciou na mídia dizendo que o veto é “candidatíssimo a ser derrubado”. Histórias estarrecedoras levantadas pela mídia, como o uso de proteção com papel de jornal, pano e miolo de pão por adolescentes e mulheres, demonstram a importância da Lei. Está comprovado que a falta de absorventes causa a ausência de meninas nas escolas em uma média anual de 45 dias. A indignação generalizada na sociedade, incluindo os meios de comunicação, fez com que o governo repensasse sua postura e se comprometesse a “viabilizar a aplicação de um projeto que prevê a distribuição gratuita dos protetores femininos”, conforme divulgado na mídia.

A resposta da sociedade contra o posicionamento do governo foi rápida e vem se dando ainda. Há cerca de dez projetos no Congresso que observam esta necessidade de distribuição gratuita destes produtos de higiene e até os que estabelecem isenção de impostos. Legislações estaduais e municipais estão sendo aprovadas para garantir o direito das mulheres e meninas à sua saúde menstrual. Em São Paulo, por exemplo, uma campanha de combate à pobreza menstrual, organizada por oito entidades beneficentes e a CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitano, arrecadou mais de 32 mil itens de higiene pessoal feminina. A Prefeitura da Capital se comprometeu a distribuir absorventes para mulheres em situação de rua a partir de novembro.

Em todas estas iniciativas, a pressão dos trabalhadores e da população está sendo essencial. As entidades filiadas à CNTSS/CUT estão levando este debate em seus Estados e conquistando vitórias, como as que aconteceram no Maranhão e Ceará. A precarização no atendimento destes direitos não pode ser tolerada de maneira alguma em qualquer sociedade civilizada do século XXI. O SUS possui recursos para garantir a implementação da Lei nº 14.214/2021. É preciso ampliar este debate sobre o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual e às demais medidas de direitos das mulheres brasileiras com toda a sociedade para que seja possível derrotar a misoginia de Bolsonaro.

Ao mesmo tempo, a Confederação chama a atenção para a necessidade de destinação de mais recursos para a Seguridade Social. O atendimento deste serviço proposto na Lei é de responsabilidade das áreas da Saúde e Assistência Social. Ambas, assim como a Previdência, vêm sendo prejudicadas pelo desfinanciamento causado pela EC 95. É preciso que os recursos públicos sejam ampliados e aplicados para garantir saúde, trabalho e renda para a população. Não podemos aceitar a política de morte e desamparo estabelecida pelo governo Bolsonaro.