“Voto proporcional como temos no Brasil tem a vantagem de permitir representação de todas as correntes de opinião”, diz professor da USP. Para ele, melhoria do sistema poderia ser obtida com outras medidas.
O sistema eleitoral conhecido como “distritão”, aprovado em comissão especial da Câmara na quinta-feira (10), é um “retrocesso” da democracia brasileira e torna as eleições de deputados federais, deputados estaduais e vereadores mais imprevisíveis. “O voto proporcional tal qual nós temos no Brasil tem uma vantagem de permitir a representação de todas as correntes de opinião, conforme a proporção de votos que tiveram. O ‘distritão’ introduz um elemento de imprevisibilidade”, diz Renato Janine Ribeiro, professor de Ética e Filosofia Política na Universidade de São Paulo (USP) e ministro da Educação de Dilma Rousseff.
Para ele, o sistema aprovado na comissão introduz um elemento aleatório. “Você vai ter deputados que conseguem e outros que não conseguem se eleger independentemente do grau de representação do partido.”
Janine Ribeiro ressalva “um único aspecto que, entre aspas, é um pouco melhor” nesse sistema. Ele inibe o lançamento de muitos candidatos. Hoje, um partido pode lançar até 150% de candidatos para eleições proporcionais em relação às vagas em disputa. Se o estado de São Paulo, por exemplo, tem 70 cadeiras de deputados federais, cada agremiação pode lançar 105 candidatos a deputado federal.
“É um número absurdo. Com o ‘distritão’, o partido vai ter que calcular: se pode eleger dez deputados, não vai interessar lançar 20 e dispersar os votos, quando mais lançar 105. O ‘distritão’ levaria a uma redução do número de candidatos. São Paulo costuma ter 2 mil candidatos a deputado federal e cerca de 10% geralmente tem um numero de votos que é zero. Ou seja, nem eles próprios votam em si mesmos.” O professor lembra que isso se deve, aparentemente, ao fato de que funcionários públicos obtêm licença remunerada de três meses ao se candidatarem. “O ‘distritão’ tornaria isso um péssimo negócio.”
Ressalva feita, ele observa que a melhoria do sistema poderia ser obtida com outras medidas, já que o ‘distritão’ não é uma solução que aperfeiçoaria a democracia brasileira. O mesmo resultado de impedir o lançamento de candidatos sem chance de se eleger poderia ser obtido com outras medidas. “Não precisa introduzir o ‘distritão’, que tem o problema muito grande de distorcer a representação da vontade popular. Em vez disso, é muito melhor ter cláusula de barreira ou penalidades para candidatos sem voto ou muito poucos votos. Tem muitas outras maneiras de melhorar o sistema eleitoral do que o ‘distritão’, que por sinal é uma proposta do Temer, quando era vice-presidente”, diz o professor da USP.
O “distritão” é simples. Usando o exemplo de São Paulo, os setenta candidatos mais votados no estado serão eleitos à Câmara Federal. Como anota o cientista político Fábio Kerche, apesar de ser simples e “quase intuitivo”, “esse modelo eleitoral votado na comissão, entretanto, é tão desastroso para a composição das bancadas que não reforçará a representatividade e tampouco a governabilidade”. Segundo ele, parcelas expressivas da sociedade podem ficar sem representação.
Para Janine Ribeiro, em tese, um dos argumentos que se pode utilizar é que, para um deputado ou vereador que já tem o mandato, torna-se mais fácil conseguir a vaga. “Ainda mais usando as verbas parlamentares a que tem direito.”
Para entrar em vigor em 2018, a reforma política precisa ser votada e entrar em vigor até outubro deste ano.
Fonte: Eduardo Maretti / RBA