Nova lei antiterrorismo aprofundaria crise da democracia brasileira
Para a diretora de programas da ONG Conectas Direitos Humanos, Camila Asano, o Projeto de Lei (PL) 1.595/2019, que promove uma nova lei antiterrorismo, é “escancaradamente autoritário e inconstitucional”. Em entrevista a Glauco Faria, na edição desta terça-feira (7) do Jornal Brasil Atual, ela alerta que o PL “cria uma polícia secreta do presidente da República” para “intimidar e monitorar vozes que possam ser críticas ao governo”.
A Conectas é uma das 19 entidades que assinam nota técnica contra a tramitação do projeto bolsonarista, de autoria do deputado Major Vitor Hugo (PSL-ES). O texto da nova lei antiterrorismo foi aprovado na Comissão Especial da Câmara no final de setembro. E na última quarta (1º) foi colocado em pauta, sob regime de urgência, pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). A questão acabou não sendo tratada, mas foi novamente colocada para a ordem do dia seguinte, novamente sem votação. No entanto, o projeto já figura na pauta do plenário da Câmara para esta semana e pode ser votado a qualquer momento.
De acordo com Camila, se o requerimento de urgência for aprovado, “vamos ter mais um passo dado pelo Congresso para consolidar esse momento de crise profunda da democracia no Brasil”, adverte. E pontua que o PL cria uma “aparelhagem do Estado brasileiro para poder monitorar de forma autoritária vozes opositoras”.
Polícia política
“Chamo de polícia secreta porque na verdade cria-se um sistema paralelo de inteligência de monitoramento e atuação de repressão à margem do que já temos hoje, que é a estrutura de Polícia Federal e a própria estrutura da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Elas já têm suas competências e operam inclusive na questão do combate ao terrorismo e a ameaças que poderiam eventualmente existir no Brasil. Qual a necessidade de se criar uma estrutura paralela, a não ser a presidência da República ter em suas mãos uma polícia secreta?”, aponta Camila.
Outro ponto que preocupa as entidades é a definição vaga de terrorismo no projeto de lei, ampliando a definição legal prevista na legislação de 2016. Segundo a Conectas, embora o PL 1.595 não se apresente como uma alteração da lei, na prática, o texto acaba indo contra o que foi aprovado pelo Congresso Nacional há cinco anos. “Ele vai praticamente abarcar qualquer atuação mais crítica aqui no Brasil como passível de ser definida como terrorismo”, analisa Camila.
Sociedade desprotegida
“Estamos falando de uma estrutura que vai ser criada para intimidar e monitorar vozes que possam ser críticas ao governo. Isso tanto vindo de opositores políticos, da imprensa livre, movimentos sociais e entidades da sociedade civil. E tem a ver com essa questão do monitoramento e o suposto uso das atividades de inteligência, mas para um fim errado. É um desvio não para proteger a soberania do Estado, mas para (proteger) os interesses particulares de quem esteja ocupando a presidência da República”, contesta.
As organizações também advertem quanto à nova tentativa do governo Bolsonaro de incluir na proposta o “excludente de licitude”. “Que nada mais é do que uma licença para matar”, resume a Conectas. A avaliação é que, ao permitir que policiais possam, em suposta legítima defesa, tirar a vida de pessoas sem responder por isso, a impunidade será a “regra”. “É por conta destes e de vários outros pontos apresentados por outras entidades da sociedade civil e até mesmo por vozes internacionais relevantes que esse projeto não pode avançar”, conclui Camila Asano.
No final de outubro, 14 organizações internacionais assinaram um documento denunciando que a nova lei antiterrorismo ignora recomendação das Nações Unidas sobre riscos para a proteção dos direitos humanos, especialmente da liberdade de expressão e do direito à manifestação.
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